Aliando a filosofia e o conhecimento histórico à tradição artística, religiosa, mítica e espiritual portuguesa, António Quadros tornou-se num dos principais hermeneutas da cultura nacional. Poucos homens terão mergulhado com tamanha intensidade e profundidade nas raízes matriciais de Portugal. As suas obras tornaram-se fundamentais para a compreensão integral da nossa Pátria, tão marcada pelo mistério, como pela razão animada que lhe subjaz e que, segundo Álvaro Ribeiro, reflecte a tremenda manifestação do Sagrado. “Portugal, Razão e Mistério” é o título de uma das obras mais importantes da sua vasta bibliografia, tendo sido reeditada na primeira metade de 2020, num tomo único, compilando os três volumes que a compõem.
Conforme foi referido num número da revista Nova Águia que lhe foi dedicado aquando das comemorações dos 90 anos do seu nascimento, António Quadros foi “o rosto mais visível da Filosofia Portuguesa”. Homem de génio e de vasta cultura sapiencial, tornou-se desde tenra idade bastante activo na vida intelectual portuguesa. Fez parte do grupo da Filosofia Portuguesa, frequentando as tertúlias animadas por Álvaro Ribeiro e José Marinho, tendo sido discípulo destes, juntamente com Afonso Botelho, Pinharanda Gomes, António Braz Teixeira, os irmãos Orlando Vitorino e António Telmo, entre outros nomes de vulto que figurariam também como dinamizadores do célebre ‘Movimento 57’.
Toda a sua obra denota uma profunda preocupação com a Filosofia da História, também referenciada como Teoria da História. A sua formação histórico-filosófica, a isso o impelia, sempre numa linha anti-positivista e não-materialista. Há em António Quadros um profundo interesse pelo lado simbólico e mitológico da alma portuguesa, particularmente latente nesta sua trilogia “Portugal, Razão e Mistério” (brochado, 592 páginas, 24,95 euros), agora publicada pela Alma dos Livros, em parceria com a Fundação António Quadros.
Dividindo-se em três livros cujos nomes nos permitem formular uma ideia sobre os conteúdos gerais desta obra, temos a primeira parte que trata da Arqueologia da Tradição Portuguesa, Portugal Arquetípico, Atlântida e nação templária; a segunda, que analisa o nosso Projecto Áureo dos Descobrimentos e o Império do Espírito Santo; encerrando com “O Cálice da Última Tule”. Para além de uma perspectivação teleológica da nossa História, António Quadros revela-nos neste trabalho as várias idades ou ciclos míticos de Portugal, apontando um caminho futurante para a regeneração de corpo e alma pátrios, através do cumprimento e realização da nossa “paideia”.
Parafraseando Pinharanda Gomes, é legitimo dizermos que a História de Portugal só pode ser escrita e interpretada desta forma, obedecendo a uma leitura desocultada da nossa existência quase milenar. António Quadros não só elencou esses mistérios contíguos à essência portuguesa como nos apresentou a chave para a sua leitura e compreensão. Isto acontece em particular na terceira parte desta obra que, durante mais de duas décadas, se supôs perdida. Resgatada do seu espólio graças ao excelente trabalho que tem vindo a ser realizado por Mafalda Ferro, Presidente da Fundação António Quadros e organizadora desta edição, a terceira e última parte desta obra encontra agora a sua primeira publicação através deste volume que conta ainda com uma nota prévia de Joaquim Domingues e um posfácio de Pedro Martins.
Este é, sem dúvida, a par da obra “As Literaturas em Língua Portuguesa” de José Carlos Seabra Pereira, o mais importante livro publicado em Portugal durante 2020. Trata-se de uma obra fundamental, incontornável para compreendermos a origem, passado e futuro de Portugal.
