O dia 10 de Junho faz troça dos conceitos. A morte e a vida confundem-se entre o fim da carne e a imortalidade do espírito. Todos os espíritos são eternos, mas nem todos os nomes o são. Esta data levou Luís de Camões do mundo para o juízo, mas Portugal transformou a morte em vida e o choro em celebração.
O poeta do génio incomparável deu, além dos versos, o seu nome à pátria. Os Lusíadas é um dos monumentos que cabe nas nossas mãos, que lemos com o espírito porque Portugal não cabe nos olhos. A Ilíada de Homero, Grécia, a Eneida de Virgílio, Roma e Os Lusíadas de Camões, Portugal, são os livros sagrado-civis das nações, criadas por profetas sem direito à voz que se cumpre, mas à voz que se eterniza. Os versos camonianos, do heroísmo de punhal à espada conquistadora, da resistência milagrosa ao império dos mares, de Portugal a Luís de Camões, conquistaram o raro galardão do sacro-civil, que se pode urdir no sei-quem-é colectivo.
Conhecer Luís de Camões é fazer do coração um mapa, a bandeira ganha a nitidez do espírito, há cor além da cor, mais amor do que pano. Quem nunca leu uma estrofe d’Os Lusíadas é um pouco menos português.
Canto I
As armas e os barões assinalados,
Que da ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca de antes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram
O trono cronológico é dividido por Camões e pelo Anjo Custódio, o Anjo de Portugal, escudo celestial da pátria. Esse mensageiro de Deus que soprou fogo triunfal no espírito de El Rey D. Afonso Henriques na véspera de Ourique e que preparou o caminho das aparições de Nossa Senhora junto dos três pastorinhos, é adorado em várias imagens de óleo santo ou de pedra escultural, na Basílica da Estrela, na Igreja de São Francisco de Évora, no Convento de Cristo, na Igreja da Encarnação de Lisboa e na Real Basílica de Mafra.

Anjo Custódio, que viste o pranto imberbe do nosso nascimento, omite da nossa história quem a rejeita!
“São Miguel Arcanjo. Foi sempre conhecido dos Portugueses por Anjo Custódio deste Reino, depois que o invicto Rei D. Afonso Henriques venceu com o seu patrocínio a Albaraque nos campos de Santarém; e por isso lhe erigiu copiosas Capelas, assim na Igreja de Alcáçova da dita Vila, como nos Mosteiros de Santa Cruz de Coimbra e Santa Maria de Alcobaça, onde as suas santas Imagens são veneradas, e milagrosas.” – Jorge Cardoso, Agiológio Lusitano dos Santos e Varões ilustres em virtude do Reino de Portugal, e suas conquistas, Tomo III, p. 126. Lisboa, 1666.
Se não cultivarmos o amor à pátria, se não formos portugueses além da geografia, o dia de Portugal não passará da rotina do Sol. Nós, filhos do sonho afonsino, reconquistar-te-emos das mãos rubras da traição. A nossa descendência saberá o nome de Portugal além das 8 letras e o futuro celebrará o 10 de Junho com sorriso de pertença.
Viva Portugal!

Escritor, Historiador, Apologeta