Existem perguntas que nos têm sobressaltado nestes tempos. Quando é que o isolamento social será levantado? As extraordinárias medidas que foram tomadas e os esforços pedidos para conter o vírus e diminuir a curva serão para nada quando voltarmos à normalidade, ainda sem a vacina, correndo o risco de uma segunda quarentena? Iremos ficar 18 meses em casa à espera de uma vacina, ou iremos regressar à normalidade mesmo convivendo com o vírus? E quando voltarmos ao mundo, espera-nos uma crise ainda pior?
Para já, penso que o estado de emergência a ser levantado, será sobretudo para ganhar o máximo de tempo possível para nos preparar para um acontecimento que não estávamos de todo preparados, mas que será inevitável. Aliás, como o próprio governo admitiu no fim da semana anterior, talvez a maior vitória no imediato que possamos ter em relação ao covid-19, seja ter de aprender a viver com ele nas nossas vidas, pelo menos até ao surgimento de uma vacina. Temos tido muito boas notícias nesse particular, os EUA, a China e a Alemanha têm dado passos significativos na nova vacina. A Presidente da Comissão Europeia chegou mesmo dizer que poderemos ter uma vacina disponível antes do próximo Outono, mas no pior dos cenários teremos de esperar mais de 18 meses. Acho impossível ter um país fechado com todos em casa durante 18 meses, no limite morreríamos todos da cura. Esperar uma vacina não será a estratégia implementada por nenhum país. Contudo, a balança entre salvar a economia, ou por outro, conter o mais possível a curva de avanço da pandemia é real e ninguém ainda percebeu como arranjar um equilíbrio entre as duas.
Para além do objetivo de diminuir a curva de infetados pelo covid-19, parece-me que os governos trabalham já hoje para o regresso à normalidade. No fundo, quando isto surgiu a nossa única linha de defesa eram os médicos, enfermeiros e os sistemas de saúde, mas quando progressivamente as medidas de isolamento social forem sendo levantadas teremos de ter uma capacidade de despistar o coronavírus muito mais rápida, acessível e eficaz, teremos de incutir o uso das máscaras como um elemento indispensável no nosso quotidiano. Praticamente em todos os países, o uso de máscaras tem sido aconselhado como medida de precaução e acredito que em Portugal acabará também por ser assim. É compreensível que nesta fase seja dada prioridade aos profissionais de saúde, mas isso mudará quando o confinamento for levantado e forem produzidas mais mascaras. Apesar de tardar a vacina, será plausível o aparecimento de um medicamento eficaz para tratar também o novo coronavírus. Portanto num futuro muito próximo as nossas defesas serão: testar massivamente e com eficiência, máscaras como elemento preventivo, algum medicamento que possa surgir para o combate do vírus e por fim, os sistemas de saúde. Pode não parecer, mas quando chegarmos a este ponto a diferença será abismal em comparação com as defesas que tínhamos no dia 1.
Se quisermos dividir em fases, então proponho 3 fases distintas. Uma primeira, a atual em que nos encontramos, onde temos decretado o estado de emergência, o distanciamento social e as quarentenas, apenas os serviços básicos de abastecimento da população estão permitidos. Uma segunda, a partir do momento em que a curva estiver controlada e os serviços de saúde aliviados, será levantado o confinamento com medidas muitas preventivas para podermos relançar a economia. Nesta fase será absolutamente crucial o compromisso nacional de todos, seria catastrófico termos uma reincidência no número de casos que nos obrigasse voltar à primeira fase. Por fim, a terceira fase que chegará quando tivermos à disposição uma vacina, nesse momento vencemos o vírus e poderemos progressivamente voltar à normalidade.
A Europa é o atual centro da pandemia e temos o mundo a observar-nos como nunca. Jamais poderemos adotar as medidas que extrapolam a dignidade humana como na China, mas temos o bom exemplo da Coreia do Sul onde a palavra de ordem foi: testar. A União Europeia vive uma prova de fogo, e se antes, vivia com questões existencialistas, tem agora a sua grande oportunidade de demonstrar a sua utilidade. Sobretudo depois desta última década em que sobressaiu mais aquilo que nos separa, do que o que nos une. É tempo de provar a amizade entre as nações. Numa primeira chamada, falhou com Itália quando esta clamou pela sua ajuda, apesar de compreensível. Terá uma nova oportunidade no pós-crise de saúde pública e no princípio da reconstrução das economias dos seus membros. É nas dificuldades que descobrimos as verdadeiras amizades, falhar aqui hipoteca definitivamente o projeto europeu.
Em democracias andamos ao ritmo do último e não do primeiro, isto é, daquele que demorará mais tempo a perceber a emergência da situação em que vivemos. Isto desgastará certamente os nossos regimes e levantará questões, medos e no limite até outros ímpetos, mas não podemos ter dúvidas sobre isto- a democracia continuará a ser o menos mau dos regimes. Por isso, dos governantes temos de esperar a máxima clarividência, os europeus merecem sempre a verdade. Dos cidadãos espera-se o máximo compromisso, só juntos ultrapassaremos aquela que será a hora mais negra da nossa geração. O repto que lanço devido aos tempos que teremos pela frente é claro- não podemos deixar ninguém para trás. Ao medo responderemos com realismo, ao pânico com informação e esclarecimento. É incontornável os tempos difíceis que teremos adiante, mas temos recebido indicadores que não só a recuperação económica é possível, como será muito mais rápida do que poderíamos esperar. Se na Europa nenhum Estado membro pode ficar para trás, do norte ao sul, dos mais ricos aos mais pobres, em Portugal nenhum português pode ficar para trás, de Bragança ao Algarve passando pelas ilhas e do litoral ao interior.
José Maria Matias