É difícil escrever algo depois de ler o relato de um dia tão negro. Só me resta agradecer à professora Vanda Arroteia a coragem de vir a público e desejar do fundo do coração que este momento permita atenuar um pouco do vazio que sente.
“Um assunto muito falado nestes últimos tempos é o da violência nas escolas. O que se passa não é de agora é algo que é antigo, no entanto tem sido silenciado, quer por vergonha de quem sente na carne e na alma o vexame de ser agredido no seu local de trabalho, quer pela tutela que tudo faz para abafar as ocorrências.
Eu própria perdi o meu terceiro filho quando me encontrava grávida de 16 semanas no meu local de trabalho. Passo a contar algo que silenciei durante anos porque me doía demais falar no assunto. Naquela manhã de maio, estava eu na sala de aula com os meus alunos do 1º ano (crianças de 6 anos), quando ouvi um grande alarido. De repente a mãe de um aluno entrou na sala, completamente descontrolada dirigiu-se a mim e no meio de insultos tentou agredir-me. Desviei-me e valeu-me o socorro pronto de duas assistentes operacionais que ao ouvirem os gritos das crianças em pânico a agarraram e colocaram para fora da sala.
Apesar de nervosa e em choque tentei acalmar os alunos. Senti-me de repente agoniada, com tonturas e fortes contrações. Chamei uma colega e fui cambaleante até à casa de banho, para terror meu a sanita onde me sentara estava coberta de sangue e coágulos, gritei por socorro. Fui para o hospital e quando lá cheguei o médico disse-me que tinha sofrido um aborto e que nada mais havia a fazer, que não me fazia uma raspagem pois os restos que ficaram iriam sendo libertados ao longo dos meses seguintes.
Assim foi, durante três meses tive contrações que me lembravam sistematicamente o crime de que tinha sido alvo. O ME nunca se me dirigiu. A mãe agressora respondeu perante a justiça e nada lhe aconteceu.
Procurei apoio de psiquiatras e tive de os pagar do meu bolso. No ano seguinte contra a vontade dos restantes pais daquela turma fui colocada numa outra escola. Perdeu-se uma vida, a da criança que carregava no ventre e a revolta e raiva até hoje permanecem comigo, um crime que não teve punição a não ser para mim mesma.
Vanda Arroteia”
Nota:
Esta agressão ocorreu há alguns anos, mas nunca foi conhecida. Quantas mais terão sido ignoradas?
O ComRegras irá continuar a denúnciar a violência escolar, não com o intuito de criar qualquer tipo de alarmismo, mas para que a realidade seja conhecida e que a (in)disciplina se torne prioritária nas políticas educativas.
Enviem as vossas denúncias para blogcomregras@gmail.com
4 de Novembro de 2019
Fonte:
https://www.comregras.com/professora-perde-bebe-depois-de-ser-atacada-em-sala-de-aula/