Antes de mais, recomendo ao leitor que não prossiga se não estiver ciente do significado, pelo menos simbólico, dos termos constantes no título deste artigo.
Designamos por Império a ordem internacional desenhada nos últimos três séculos e que ainda se mantém sob o domínio do Ocidente. Num processo de autofagia histórica e cultural, como bem sabemos, esta ordem é estabelecida e conduzida por um vasto cluster de redes político-ideológicas que têm em comum a destruição, geralmente progressiva, de um mundo “antigo” (conservador) e a construção de um mundo novo (progressista).
No que respeita o “antigo”, tendo ele evoluído a partir de conflitos e cooperações entre diferentes agentes (pessoas, povos, nações), resultou em múltiplos poderes e contrapoderes intra e internacionais, os quais se expressaram, por sua vez, em variadas nações, tradições, religiões e mundividências com autonomia própria (incluindo a de pequenos núcleos, como as famílias, as empresas, as associações, as terras e propriedade privada).
Já no cada vez menos admirável mundo novo, percebemos que tudo é imposto de cima para baixo. É desenhado, planeado e regulamentado por plataformas internacionais (ONU, FMI, UE, etc.), organizações tecnocráticas (ex. OMS) e activistas (ex. Amnistia Internacional, grandes fundações, ONG’s), em coordenação com os Governos Locais, que quase se limitam a executar as directivas. Deste modo, temos uma elite constituída por famílias oligarcas, multibilionários que reclamam todo o poder para si e se dedicam a fazer de nós os seus “Sims”, com a ajuda de intelectuais, políticos e, sobretudo, dos Grandes Media por eles sustentados.
É neste sentido que chamamos “socialista” a este Império, pois, ao contrário do que muitos pensam, o socialismo não consiste tanto na utopia quanto no processo e na estruturação do poder que a visa alcançar. Motivo pelo qual, também contrariamente à crença comum, em nada se opõe ao capitalismo e ao livre mercado, usando frequentemente as suas formas mais extremas (libertarianismo, corporativismo fascista, neoliberalismo, i.e., “direita socialista”) como instrumentos dialécticos para a concentração do poder económico e financeiro nas mencionadas elites. Com efeito, qualquer economia, por mais liberal que seja, pode ver os seus frutos ao serviço das várias agendas progressistas de destruição dos valores identitários “antigos”, impondo o relativismo moral e, consequentemente, a economia como único factor valorativo da vida em sociedade.
Assim, para quem se lembra deste clássico dos jogos de computador, o Sims pode ser uma boa metáfora para compreendermos o contexto atual, considerando particularmente o recente fenómeno da pandemia COVID-19. Façamos, então, um balanço sob diversas ordens:
- Ordem pública: As pandemias são um dos raros casos em que se exige a concentração de um poder que imponha medidas extremas, sem que este seja excessivamente contestado por legítimos contrapoderes. Deste modo, é mister que se obedeça em uníssono às medidas dos governos, tal como acontece na guerra justa. Porém, estejamos muito atentos à actuação das autoridades, quer nacionais quer internacionais, para que este poder excepcional não as vicie em demasia. Não seria nada bom que se habituassem a tanta obediência.
- Ordem psicológica, no âmbito político-social: Fenómenos como a COVID-19 são como um “trigger fóbico” para a mentalidade obsessiva-compulsiva do socialismo imperial, que até a sexualidade das crianças pretende educar, planificar e regulamentar. Nada pode fugir ao controlo, em especial os impostos e contribuições (vulgo “dinheirinho”). Segundo a moral laica do sistema, se por acaso algum velhote, numa tasca perdida da sua aldeia, se esquecer de pedir a factura do seu copo de três, é dever de todos nós repreender a sua falta de civismo enquanto contribuinte. Ora, bem sei que se trata de uma hipérbole, mas quem entra em parafuso com as minudências mais ridículas, é bem natural que se refugie na negação e fique paralisado diante de uma pandemia. Claro está, porém, que a qualquer momento esta mentalidade poderá inverter-se, alimentando no sujeito (socialismo imperial) um sentimento de omnipotência (o tal poder que vicia), por meio do controlo e a manipulação das massas, e projectando no povo as suas próprias fobias. Neste sentido, no dia em que o Ocidente conseguir conter esta crise, irá muito provavelmente aproveitá-la para reforçar o poder das elites sobre a mente dos seus sims, nomeadamente, através do proselitismo ambientalista. Com base na experiência social do coronavírus, é quase certo que tentarão adaptar a narrativa e usar técnicas de manipulação, desta feita aplicadas à causa climática, fazendo do novo panteísmo uma religião totalitária e histérica (o que, em certa medida, já acontece).
- Estratégia e prazos: Felizmente, nem a mim nem a vós, leitores, nos compete resolver este dilema, tal é a sua delicadeza e gravidade. Por um lado, se as medidas impostas não forem suficientemente rígidas (incluindo o teste intensivo e o encerramento de fronteiras) o vírus poderá infectar 70% da população e matar aproximadamente 2% da mesma (a uma taxa de mortalidade de 3%). Por outro, por quanto tempo poderemos parar a produção económica? A médio prazo, um trade-off que privilegie as medidas de saúde, em detrimento da economia, poderá resultar em muitas mais mortes (doenças, subnutrição, fome, etc.), já que a própria saúde é sustentada pela economia. Fala-se também da abordagem inglesa, mas como os nossos meios de comunicação quase se engasgam a falar do assunto – tal é a ânsia de demonizar o governo de Johnson – confesso ainda não dispor de informação suficiente para opinar sobre ele.
- Eventuais consequências: Sem dúvida que o Império, enquanto entidade sob o domínio ocidental, pode sair muito fragilizado nos próximos anos, caso não consiga controlar (quase simultaneamente) ambas as realidades – saúde e economia. A acrescentar às mortes causadas pela doença, uma drástica quebra na produtividade impossibilitará o pagamento das dívidas soberanas, o que resultará no colapso do sistema económico-financeiro. Então, estimulando a revolta popular, não faltam movimentos anti-sistema organizados, não só pela alt-right, mas sobretudo pelas redes internacionais comunistas (ex. autonomistas, trotskistas, marxistas-leninistas) – i.e., do “socialismo genuíno” (não confundir com a New Left ou esquerda caviar; embora esta também possa trair os seus parceiros, do “socialismo vigente”, e juntar-se à festa) – as quais contam com o apoio de intelectuais da esquerda politicamente incorrecta (ex. Negri, Žižek, Chomsky) e a “simpatia” do regime Russo. Pois, há muito que o Oriente (desde o médio ao extremo) pretende ter as rédeas imperiais, e não duvido que verá no caos e, quem sabe, na guerra, os meios adequados para as alcançar. Por outro lado, as elites ocidentais poderão ainda reverter o mencionado colapso financeiro por meio da criação de uma nova moeda digital; algo que irá necessariamente reforçar o Império, mesmo que à custa da redefinição das suas estruturas de poder. Deste modo, não será surpreendente que este se torne efectivamente global, nem que mude a sua “sede” para Pequim.
Por fim, não sou nem pretendo ser o Zandinga… só mesmo ele conseguia falhar em quase todas as suas previsões. Apresento somente a minha opinião e conjecturas pessoais. Tudo isto pode ficar mais evidente em breve ou ir acontecendo lentamente, cozendo-nos como sapos numa panela orwelliana. Mas, de uma coisa podemos ter a certeza: nada de bom poderá vir de bestas iluminadas que fazem do mundo o seu jogo de Sims.
Arq. Maciel Rodrigues
17 de Março de 2020