Não sendo naturalmente dotado para a aprendizagem de idiomas estrangeiros, dou graças ao Senhor por me compensar com o dom em imitar sotaques estrangeiros na hora de falar Inglês, aliado a um interesse inato pela caricatura (a que os cretinos, ofendidos que nem Madalenas, chamariam de estereótipo). Entres estas, creio, saem-me melhorzinhas as sátiras aos russos, indianos, franceses e pessoal do Médio-Oriente/Magrebe, sendo que os dois últimos, fisicamente falando, se tornaram quase tão indiscerníveis quanto gémeos separados à nascença.
Fisicamente falando, feições, trejeitos e etc., pareço-me bastante a um indivíduo do Médio Oriente, tornando o retrato completo, do timbre ao tópico, acabando na ponta do nariz. Barrigadas de riso circundam-me quando conto: “One day I was in Lake Balaton, you know, on my own and with a big bag, and people thought I was a terrorist. You should see their face when I left my stuff in the towel, or even when I was in the towel, laying down and stretching my muscles, and they were thinking I was going to pray like my brothers, you know, pray in my country”. Este relato tem o seu quê de verídico e exagerado, sabemo-los todos, agarrados à nossa barriguinha. Aos azedos, sem sombra de sorriso no rosto, escapa a piada, comentando que as pessoas do campo são estúpidas e se assustam, por acreditarem piamente nas mentiras do governo.
Típico comportamento da capital. Eles, somente eles, os privilegiados, têm acesso à informação, enquanto os outros, os atrasados, são manipulados como gado. Como se na oposição não existissem agenda e propaganda. Estes cidadãos de Budapeste, que se dizem cosmopolitas e de mente aberta, não fazem ideia de que, em qualquer país, o contato com canais alternativos é proporcionalmente restrito à distância de que se vive dos grandes centros urbanos. Estes cidadãos de Budapeste, que se dizem tolerantes e abertos ao debate, na sua cegueira, desconhecem que mais não são do que outra personificação da prepotência da capital, fenómeno que – óbvio aos olhos de quem viaja – é tristemente transversal a todas as nações.
Não pretendo com isto o romântico elogio do campónio húngaro ou de quem a terra trabalha com a enxada. Existem evidentes faltas de educação (assim como existe uma crescente ideologização nas universidades, nomeadamente nas ciências sociais e humanas) e carência de confronto com o outro, nos ambientes rurais. Por outro, quem vive dos e com os animais, não vai com cantigas nem campanhas orquestradas por quem morre de amor por cãezinhos que só conhecem o mundo além da marquise, quando saem à rua para cagar.

Parque Millenaris
Também não virá de mim o encómio das tribos dos subúrbios ou das segundas cidades (Debrecen, no caso Húngaro). Ambas vivem à sombra do poder, sonhando com o poder, estando os primeiros mortinhos por trocar o seu palheiro pelo parlamento e os segundos em transformar a sua pocilga no próprio parlamento. Ambas são criaturas feias, suínas, de ambições Orwellianas.
Para terminar, voltamos a Budapeste. Durante um date com uma Húngara do interior e bem-sucedida em Budapeste (outro fenómeno escarrapachado na supracitada fábula dos porcos), chefe de recursos humanos numa multinacional, defensora da diversidade, coloquei o seguinte exercício “Tens que contratar alguém que domine Holandês e entrevistas dois candidatos. O cigano fala Holandês fluente, mas não escreve. O outro, sem nenhuma etnia ou sexualidade que encaixe no preconizado pela diversidade, pode-se expressar em Holandês oralmente e por escrito. Quem contratarias?” Respondeu que escolheria o cigano, apesar de imediatamente lhe contrapor que acabava de comprometer a comunicação com os clientes.
Puxar de tal assunto delicado, dirão alguns, parece não concorrer para os meus libidinosos propósitos. Cabe-me explicar o contexto. Ao revelar que um amigo fizera check-in, entre outros hóspedes famosos, a Viktor Orban, num hotel no Brasil, a criatura ficou em choque por o considerar alguém afamado. Com amabilidade, expliquei o conceito de fama: alguém que, independentemente das qualidades ou supostas virtudes, é reconhecido na rua ou na praça pública. Ainda assim, a mula insistiu que Orban poderia sê-lo na Hungria profunda, habitat dos idiotas, mas jamais entre os seus amigos de Budapeste, gente inteligente e com canudo.
Mas não será a verdadeira diversidade a arrogância da capital, lado a lado com um certo alheamento do povo aldeão, somado à inveja da malta dos subúrbios e ressentimento de quem nasce e cresce na segunda cidade? Não será essa a manta de retalhos que constitui o grosso de qualquer nação e com o qual todos devemos conviver, em mútua inter-aceitação e esforçando-nos, com as nossas diárias ações, por melhorar o dia de amanhã? Acaso é um raciocínio tão rebuscado?
