Foto de fábrica no Bangladesh que produz vestuário para a Lululemon. Euronews.

As empresas, como os clubes de futebol e os partidos políticos, são organizações sociais: associações de pessoas que combinam os seus esforços pessoais na prossecução de um ou vários objetivos comuns. Tal como os clubes de futebol e os partidos políticos, as empresas cumprem várias funções sociais importantes para a comunidade e para as pessoas: dão trabalho a uns, fornecem bens e serviços suficientemente em conta para que outros os queiram comprar, dão a possibilidade a aforradores de aplicarem as suas poupanças através de participação no capital ou aquisição de dívida, e pagam impostos para que o estado financie a provisão de bens públicos (embora os partidos políticos se furtem a esta contribuição social, auto isentando-se do pagamento de impostos…). 

Como tudo aquilo que é bom, só nos damos conta da vantagem de termos muitas empresas à nossa volta quando elas, por algum motivo, se tornam escassas. Quem vive em regiões onde há poucas ou nenhumas empresas não consegue emprego e, ou cai na pobreza, ou migra para regiões onde as há em abundância; tem dificuldade em adquirir os serviços de que precisa, desde o da imagiologia clínica ao do cabeleireiro, sem visitar aqueles locais onde empresas do ramo atuam, e em comprar o que precisa ou quer, seja um kiwi ou um automóvel, sem fazer uma viagem mais ou menos incomoda e inconveniente; ou se os conseguem encontrar localmente, são a preços de monopólio, devido à inexistência de concorrência. Sem empresas, sem muitas empresas, e sem o sistema de livre iniciativa vulgar e incorretamente denominado de ‘capitalismo’, não poderíamos viver como hoje vivemos, nem poderíamos usufruir de um décimo das coisas que hoje damos por adquiridas. Viveríamos como cubanos.

Mas tal como existem clérigos que dizem Missa e opinam que Nosso Senhor Jesus Cristo não é Deus, há empresas que ganham lucro & dizem que são anticapitalistas. Um dos casos mais recentes é o da multinacional Lululemon, uma empresa multibilionária canadiana, cotada em bolsa, que ‘produz’ e comercializa leggins para mulheres com ‘thigh gap’. A empresa, com uma capitalização em bolsa de US$ 45 biliões, promoveu recentemente um workshop de yoga sob o tema de “resistir ao capitalismo” e “descolonizar o género”, em que as participantes aprenderiam “como as construções de género em todo o mundo estruturaram a cultura e como a violência colonialista apagou essas histórias para impor o consumismo.” Esta sandice deu origem a uma onda de escárnio nas redes sociais, sinal de que ainda existe alguma sanidade nesse mundo paralelo. “Lululemon É capitalismo”, disse uma comentadora. “Se são anticapitalistas que saiam da bolsa”, twittou assisadamente outra. Espera-se, de facto, que aqueles que pregam o anticapitalismo vivam como anticapitalistas. Ou seja, como cubanos.

Assim, antes de começar a pregar o anticapitalismo e promover o dito workshop, a empresa devia começar por descapitalizar-se. O primeiro passo na via do anticapitalismo que Lululemon devia dar, não é fazer yoga, é sair da NASDAQ e deixar de ser cotada nesses antros mais tenebrosos do capitalismo anónimo que são as bolsas. O segundo seria alterar a sua estrutura societária, deixado de ser sociedade anónima. Uma possibilidade seria tornar-se uma cooperativa. Mas como no movimento cooperativista ainda há um óbvio resquício de capitalismo, o ideal seria tentar atingir diretamente o nirvana da coletivização total dos meios de produção. Como? Através da sua nacionalização. Aqui surge um problema: nem o governo do Canadá, onde a empresa tem a sede, nem o dos Estados Unidos, onde tem a maioria do seu negócio, têm os instrumentos jurídicos necessários, que são o desrespeito pela propriedade e liberdade das pessoas e a prepotência de governos não eleitos, para proceder à nacionalização de uma empresa privada. A solução passa, portanto, por pedir a um governo estrangeiro, com competência demonstrada no empobrecimento do seu país, para que a nacionalize. Para tal, não é necessário a Lululemon ir muito longe: certamente que o governo cubano não se furtaria a essa oportunidade de promover a ‘justiça social’ à escala global.

Outra coisa que Lululemon devia fazer antes de começar a pregar aos outros, é diminuir o preço dos seus produtos. Os seus leggins, de US$ 100 para cima, estão entre os mais caros no mercado, e segundo informação disponibilizada pela empresa, são vendidos, em média, a cerca de duas vezes e meio o seu custo. Esta é claramente uma prática comercial do capitalismo selvagem, que a empresa diz querer combater. Para iniciar esse combate, escusam de sair do edifício sede. Uma redução do preço de venda dos seus produtos contribuiria para a cura de duas chagas do capitalismo de que a empresa claramente padece: a exploração desenfreada dos seus clientes, vítimas do consumismo por ela promovido, e lucros operacionais obscenos, de cerca US$ 890.000.000, quase um bilião!, no ano fiscal de 2019. Uma empresa firmemente dedicada a combater o capitalismo, e a promover o socialismo, nunca devia vender os seus produtos a um preço superior a metade do seu custo. Se o conselho de administração da Lululemon tem dúvidas sobre como isso se faz, qualquer gestor de uma empresa na órbita do estado português, seja a Cp, seja a Tap, lhe poderá explicar.

Uma medida não menos importante que as anteriores, e que a Lululemon devia tomar independentemente de querer contribuir para a construção de uma sociedade socialista ou não, seria fazer parar com os espancamentos às trabalhadoras nas ‘suas’ fábricas. ‘Suas’ fabricas é uma maneira de dizer, porque para aumentar a rentabilidade do capital, a empresa não investe em fábricas, antes subcontrata a produção dos seus produtos onde ela é mais barata. O que não quer dizer que a empresa não seja responsável pelas condições de trabalho nas fábricas que produzem os seus produtos no Bangladesh, pois pode, se quiser, impor códigos de conduta às empresas subcontratantes e monitorizar seriamente o seu cumprimento, como é pratica comum no setor. Nesses códigos de conduta, além de proibir o uso do chicote e de varapaus pelos capatazes nos centros fabris, a Lululemon poderia, se quisesse, impor à empresa subcontratada uma remuneração decente às suas trabalhadoras, não os cerca de US$ 100 que elas recebem por mês, que mal dá para comprar o par de leggins mais barato que a empresa vende.

Antes de fazer discursos sobre os males do capitalismo global, a Lululemon também podia, e devia, combater a globalização, o que, no seu caso, até seria especialmente fácil de fazer. Em vez de explorar até ao tutano trabalhadoras bangladeshi, a Lululemon poderia produzir os seus produtos localmente, contruindo fábricas nos mercados onde os vende, como é defendido por esses anti globalistas que são o sr. presidente Trump e ti Jerónimo, deste modo contribuindo para o bem-estar nessas sociedades, não só vendendo produtos que os seus consumidores querem, mas também criando lá postos de trabalho, e pagando lá (mais) impostos.

Finalmente, antes de pregar a prática das virtudes aos outros, a Lululemon devia repudiar e eliminar a sua atitude neocolonialista que se traduz na apropriação cultural que a empresa pratica com um descaramento que roça a indecência. Tal como as touradas são para os ribatejanos, o yoga é para os indianos. O difundir a prática do yoga na América e Europa é um roubo, uma espoliação e um desrespeito, segundo os mais avisados autores neowarxistas do Bloco de Esquerda, pela multimilenar cultura indiana. Mas a apropriação cultural que a Lululemon pratica não se fica pelo yoga. A Lululemon devia parar com a apropriação cultural do warxismo, um produto da filosofia alemã, algo tão peculiarmente germânico como o alfabeto gótico e o sauerkraut, que atualmente a empresa está a promover na América. O argumento que Lenine & Cunhal também praticaram essa forma de espoliação e violência cultural não é desculpa para que uma empresa que pretende ser socialmente responsável também o faça.

Se as Lululemon deste mundo querem ser arautos do anticapitalismo, por amor de Deus, que o sejam. Mas que pratiquem primeiro o que pregam.

José Miguel Pinto dos Santos, Professor Universitário.














U avtor não segve a graphya du nouo AcoRdo Ørtvgráphyco. Nein a do antygo. Escreue coumu qver & lhe apetece. #EncuantoNusDeixam